“Um homem precisa viajar. Por sua conta, não por meio de histórias, imagens, livros ou TV. Precisa viajar por si, com seus olhos e pés, para entender o que é seu. Para um dia plantar as suas próprias árvores e dar-lhes valor. Conhecer o frio para desfrutar o calor. E o oposto. Sentir a distância e o desabrigo para estar bem sob o próprio teto. Um homem precisa viajar para lugares que não conhece para quebrar essa arrogância que nos faz ver o mundo como o imaginamos, e não simplesmente como é ou pode ser. Que nos faz professores e doutores do que não vimos, quando deveríamos ser alunos, e simplesmente ir ver”

Amyr Klink

terça-feira, 8 de maio de 2012

6º dia Córdoba - Mendoza > 614 km

Acordamos cedo em Córdoba, fomos os primeiros a tomar o " desayuno" era por volta das 06:30 hs, teríamos um dia longo pela frente e sem dúvida, depois da cordilheira que ainda estava por vir, foi o dia com paisagens mais bonitas que passamos, iriamos atravessar as " altas cumbres", uma cadeia de montanhas enclavadas no meio das terras hermanas, onde a altitude máxima chegou por volta de 2.500 mts.
Ainda antes de sair, depois de alimentados fomos fazer umas fotos da praça perto do hotel, pois até então só tinha-mos conseguido sair a noite para fotografar, a cidade estava tranquila, num ritmo bem devagar ainda. Encontramos uma loja que vendia gêneros alimentícios variados, em especial salames e doces...uma pena estava fechada ainda!!!

Pegamos caminho sentido ao distrito de Carlos Paz, um vilarejo que muito me lembrou a cidade de Águas de São Pedro, aqui pertinho de casa, tipico lugar de veraneio. Paramos abastecer num posto Petrobrás na Av. Fuerza Aérea, gasolina 98 Octanas saiu por volta de 7 pesos litro, algo em torno de R$ 2,66. Até lá fora o preço do nosso combustível é mais caro. Estávamos na porta da conveniência, quando um hermano curioso se aproximou das motos e não resistiu perguntar sobre o Slider, explicamos que era para proteger a carenagem, ele coçou a cabeça pensando, disse que também possuia moto, uma BMW 650 (seis cincoenta) como eles dizem lá, nos deu umas dicas dos caminhos a seguir nas montanhas, se mostrou muito atencioso e empolgado com nossa viagem, nos despedimos e como sempre por lá nos desejou " Suerte ".

















Saindo de Córdoba sentido a Carlos Paz se toma caminho por uma auto pista pedageada, e meio mal cuidada, as vezes penso que por lá o governo cuida melhor das estradas que estão sob sua tutela do que as que são cobradas para se andar, com exceção da auto pista que liga Santa Fé a Córdoba que mais parece um tapete branco, as outras por quais passamos que era pedageada demostrava muitos pontos necessitando de reparos, talvez os pedágios seja para arrecadar $$$ para o conserto, sei lá.
Chegando a Carlos Paz, pegamos um trânsito enorme, as ruas estavam abarrotadas de gente e veículos, era um caos, nosso planejamento de chegar cedo em Mendoza começou a desmoronar ali. Em janeiro no período de férias, os argentinos afortunados saem de casa e vão atrás destes refúgios nas montanhas, ou nas prais deles e nossas, ou senão fazem pique-nique na beira das estradas mesmo, como vimos em alguns lugares, só não ficam em casa, e aquele dia parece que todo mundo estava em Carlos Paz, devemos ter perdido alí no trânsito, num trecho de aprox. 5 km, pelo menos uma hora de "rush", isto porque estávamos de moto e conseguia-mos avançar um pouco mais do que os carros. Passado o vilarejo começou a subida da serra, ainda com o trânsito bastante carregado o que não permitia desenvolver velocidade, foi um longo trecho de vários km a 60-70 km/h o que foi bom por um lado proporcionando visualizar melhor a beleza da região.
Depois de rodado uns 60 km pelas montanhas acima, já por volta das 11:00 hs, demos uma parada num platô muito bonito para dar uma descansada e fazer um lanche rápido de salame, aquele mesmo com bolor que o Duda vinha trazendo amarrado no lado de fora da mochila dele. O sabor do mesmo é indescritível, é muito diferente dos salames comerciais que temos por aqui, a carne é muito macia, parece que foi feito na véspera, com um tempero muito bom, apimentado não muito, e bastante oleoso, se apertar um pedaço é capaz de pingar óleo. Depois do lanchinho, continuamos subindo cada vez mais, começou a se formar uma chuva que ameaçava molhar nosso passeio, porém não chegou a cair, somente a temperatura mesmo que despencou, comecei a sentir um friozinho incomodo, mas não cheguei a colocar mais blusa. Quando começa a subida a vegetação ainda é bastante verde, conforme vai subindo, começa a ficar bem árido, e logo o verde dá lugar ao marrom das pedras numa paisagem meio lunar, paramos no pico em uma estrada paralela ao asfalto, da onde a vista era maravilhosa.







Depois de uma pausa para reflexionar no topo da montanha, começamos a descida rumo a cidade de Mina Clavero pela RN 20, e sentia a cada km descido a temperatura aumentar, uma estrada muito bem conservada e com um visual de tirar o folego, só deve ser meio perigoso com chuva, do contrário é só alegria. Na beira da estrada existem bastante barracas vendendo artesanias locais, e muita pele de cordeiro, uma cena que me chamou a atenção foi ver numa dessas barracas e que em algumas acaba sendo a casa do comerciante, onde estavam algumas peles penduradas num varal e logo embaixo delas um cordeirinho ainda filhote, sem imaginar que, amanhã seria ele ali pendurado ao sol.
A descida é muito bonita, com paisagem exuberante, tem momentos que vc esquece que está de moto, e parece estar voando bem próximo das nuvens. Terminada a descida, paramos para almoçar num restaurante a beira da estrada, o pedido foi "Parrillada para dos", até que enfim fomos provar a tão falada parrilla, que nada mais é do que um churrasco na chapa de carne e miúdos de vaca, porco e frango, servido bem com papas fritas e coca-cola, para dar uma ajuda na digestão e afugentar o sono pós prandial.



 Já era por volta de 14:00 hs quando saímos do restaurante e ainda faltavam aprox. 400 km até Mendoza, ou seja estávamos atrasados denovo, pegamos a estrada num sol escaldante e retas e mais retas intermináveis, o sono era constante, o Duda disse que até dava uns gritos dentro do capacete para manter a atenção, já eu, dei umas cochiladas mesmo, dormia revezando olho, eheheh. Neste trecho após passar por Vila dolores, andamos um bom trecho com alguns motoqueiros locais em motos menores, ora passávamos eles, ora eles nos passavam quando parávamos em baixo de alguma sombra de árvore a beira da pista. Abastecemos em um posto meio com cara de abandonado, mas que tinha gasolina a preços não muito convidativos, em Luján onde o frentista nos perguntou até onde iríamos, e  ao dizer que estávamos indo a Mendoza nos deu uma dica de ir por Encon que era 50 km mais perto, porém passaríamos por 183 km no meio do nada, somente uns arbustos de espinho e algumas cabras na beira da estrada, , ou seguísse-mos por San Luis que seria o trajeto mais longo, perguntou quantos km as moto faziam com um tanque e quando disse 250 km, ele disse todo tranquilo que poderíamos ir... sem posto de combustível, celular não funciona, carros bem poucos, era uma travessia arriscada mas é nestas horas que você tem que acreditar e fomos, já era por volta de 16:00 hs, pegamos via Encom pela RN 20 e a estrada vazia, numa reta sem fim para variar não tinha o que fazer, somente acelerar e contar os km, me fez lembra daquele filme " Mad Max", estradas retas sem fim, no meio do deserto com sol escaldante, só as máquinas que não tinhão nada a ver, eram bem melhores, até que chegou um ponto onde avistamos a cordilheira bem ao fundo, aquilo nos encheu de animo.



























Quanto mais km rodava-mos, mais a paisagem ia se tornando árida, já não se via muitos arbustos mais, era mais para um deserto, com direito a cactus, rio seco e vaca morta em açude seco, coisa que tinha visto até então em filme.
















Quase chegando em Encon, passamos por uma região de dunas, onde tinha vários turistas tirando fotos, coisa que não fizemos e perdemos a oportunidade pois era somente naquele trecho da estrada que as dunas aparecem. Logo chegamos a Encom, uma vila perdida no meio do deserto, que numa primeira impressão se resume a um posto policial,  um posto de gasolina e algumas casas que tem vendas de artigos locais. Neste posto policial fomos novamente parados, e fui logo jogando aquela conversa denovo pra cima do policia, " hola que tal, mucho gusto...", quando disse ser policial também aqui no Brasil, o policial chamou creio que seu chefe, um gordão desengonçado, gente boa, mais que ao saber pelo seu colega que eu também era policial, disse em tom de desdem que eu era policia no brasil, lá não era nada, se virou e voltou sentar no posto policial do outro lado da ruta, ai pensei, ferrou!! nesse meio de nada agora eles vão querer arrumar... o que novamente para minha surpresa não ocorreu, o policial hermano começou a puxar assunto sobre o trabalho aqui, demostrando curiosidade e eu em portunhol nervoso, fui levando a conversa, sendo que perguntei a ele sobre quais documentos queria ver, e nem sequer documento me pediu, ficou tudo " em casa ", aproveitei e perguntei se estava muito longe de Mendoza, e nos disse que estávamos a aprox. uma hora, nos indicou o posto de gasolina a duas quadras dali, despedidas e estrada novamente. Paramos para abastecer e a noite já ameaçava cair, meio antes da hora pois o céu estava meio cinzento de chuva, o que contribuía para formar aquele cenário sinistro de seca, morte, e tristeza, misturado ao medo e a ânsia de ver logo civilização, pegamos a ruta 142 que nos levaria até a cidade de Lavalle, onde chegamos por volta das 20:00 hs e ainda faltava mais uns 40 km até Mendoza.

 Neste trecho antes de chegar a Lavalle, como estávamos indo sentido oeste, e já era hora do por do sol, pude acompanhar pelo GPs o sol se por no pacífico, uma cena muito bacana que não sai da minha cabeça, só estando lá para ver isso. De Lavalle a Mendoza já volta  a ser trecho urbano, passando por alguns vilarejos menores com plantações de uva e azeitona, se chega pela ruta 40 a Mendoza, passando prox. do aeroporto, chegamos á cidade quase 21:00 hs, depois de 12 horas de piloto, estávamos exaustos mais muito felizes por ter chegado bem, ainda consegui fazer uma ligação via celular para minha querida esposa, que neste ponto foi muito bom para acalentar o coração e a matar a saudade de casa. Ficamos num hotel bem próximo a Plaza Independência, o lugar mais movimentado da cidade onde saímos para jantar já tarde da noite, uma " picada de jamon, queso e azeitunas", juntamente de nossa primeira Andes.!!!
Amanhã seria dia de folga e revisão das motos,  e preparativos para a travessia da Cordilheira dos Andes, o que infelizmente ficou pra próxima...




Foi um dia longo, talvez o mais vívido da viagem, passamos por muitas mudanças de paisagem, clima, hábitos, estávamos tão distantes de casa que ao mesmo tempo já começava a me sentir em casa, como um caramujo que carrega tudo o que tem nas costas, a sensação era a mesma, a vida neste ponto da viagem se tornara simples, e a vontade de ir além nos impulsionava dia após dia, amenizando o desespero imenso de pensar nos amores que ficaram e repelindo a vontade louca de voltar, que ora por outra batia no pensamento.

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